E quem está ao lado?

O diagnóstico da doença autoimune atinge a pessoa de modo avassalador. Quanto mais se sabe da doença, maior é o efeito no momento da descoberta. O paciente perde o chão e se transforma num ser inseguro e em dúvida quanto a seu futuro e a sua vida plenamente saudável.

À medida que as medicações – para quem tem a sorte de tê-las –, a revolução na vida pessoal – alimentação, atividade física – e as terapias – igualmente para quem pode delas dispor – fazem efeito, a pessoa vai retomando sua sintonia com a vida e percebe que o mundo não caiu, apenas balançou sob si.

No entanto, durante este processo inicial, a doença atinge também as pessoas que estão ao lado do paciente, mas de modo diferente. É impossível qualquer um afirmar que “sabe o que o outro está passando”. As percepções são diferentes e ninguém consegue se colocar no lugar do outro numa situação dessas. O máximo que conseguimos é fazer uma ideia de como o paciente está sofrendo, de suas angústias e de seus medos, mas em hipótese nenhuma podemos sentir o que e como ele se sente.

As reações entre as pessoas da convivência mais próxima do paciente variam. Primeiramente porque o grau de intimidade, afetividade e proximidade difere entre eles, e, segundo, porque o tipo de relação também interfere. E a mais difícil de lidar e administrar neste momento, é a do(a) parceiro(a), a relação afetivo-sensual. Ambos entram em estado de ebulição psicológica com a notícia e com as consequências do diagnóstico.

O paciente se fecha e, muitas vezes, é inundado por impulsos conflitantes, mas plenamente aceitáveis, de raiva, sede por liberdade, tristeza, vontade arrebatadora de viver, necessidade de romper com formalidades e limitações. Enfim, ele se transforma numa pessoa diferente.

Enquanto isso, o(a) parceiro(a) se fecha para tentar compreender a dor do outro. Procurar uma maneira de ser útil, atencioso, prestativo e, na maioria das vezes, não faz a mínima ideia de como se comportar diante das necessidades físicas e da explosão de sentimentos que invadiu seu par.

Ao mesmo tempo que o paciente julga seu(sua) parceiro(a) distante, por achar que ele(a) não compreende sua dor, o outro não consegue (por não ter o mesmo grau de percepção e não estar na mesma pele) acompanhar os passos. O raciocínio e o ímpeto de uma rotina totalmente desestabilizada.

E, infelizmente, é nesse momento que um pode se perder do outro. Não é fácil a convivência pacífica entre pessoas que acham que o outro, num momento importante da vida de ambos, não compreende o que ele está sentindo. Porque na verdade, ambos esperam que o outro sinta o que eles próprios estão sentindo. E isso é impossível, pois são duas percepções diferentes. Todavia, o mais importante, e que quase sempre é relevado, é que ambos estão, de algum modo, com a doença. Com a diferença que um a tem dentro de si, e outro a tem fora. Apesar de o fato de o paciente ser infinitamente mais importante sob este ponto de vista, nem sempre o outro consegue vencer esta batalha e nem sempre os conflitos conjugais são contornados ou bem resolvidos.

Quando ambos percebem isso – e infelizmente, em alguns casos isso nunca acontece –, a vida fica mais leve, mais amorosa, mais compreensiva e mais feliz. Um é o paciente, o outro é aquele que quer estar a seu lado para sempre. Cada qual convivendo com a doença de uma forma, de modo que ela fique mais leve para quem a tem. Não deixe que um amor se perca! Não deixe que uma cumplicidade vá embora apenas por achar que a percepção de dois corpos deve ser igual. Neste caso, não falamos de corpos, mas de almas. E a percepção da alma não pode ter a medida da dor física.

Texto por: Carlos Eduardo Bizzocchi
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